Um acidente de viação em Portugal
É do conhecimento público que apenas são contabilizados como mortes os óbitos que ocorrem antes da entrada no hospital ou serviço de saúde de destino, pelo que uma substancial percentagem dos feridos graves, que vem a falecer em consequência dos acidentes de viação, não são incluidas nas estatísticas.
Com a melhoria dos meios de socorro, das estradas e do suporte imediato de vida, a possibilidade de sobrevivência até à chegada a uma unidade hospitalar aumenta, sem que tal se traduz num significativo aumento da percentagem de vítimas que vêm a recuperar.
Os próprios números da Direcção-Geral de Saúde e da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR) são díspares, com uma diferença substancial a favor da primeira, diferindo ainda das estatísticas enviadas para Bruxelas.
A ANSR defende o rigor dos seus números dizendo que os números de mortes na estrada são incrementados através de uma estimativa que considera que 14% dos feridos graves morrem nos hospitais, valor que é abaixo do acompanhamento efectuado pela Polícia de Segurança Pública (PSP) de Lisboa, única entidade que efectua um controle das vítimas de acidentes ocorridos na sua área de actuação.
Mesmo considerando que o perfil do ferido grave num acidente urbano, que muitas vezes é um atropelamento, é diferente do que acontece numa via fora de uma povoação, que normalmente envolve apenas vítimas que se encontravam em viaturas, a projecção da ANSR peca por defeito quando comparada com os mais de 50% da PSP de Lisboa.
Também não nos espantou que o Governo, através do Secretário de Estado da Protecção Civil, opte por manter o actual erro, alegando a necessidade de manter critérios que facilitem a comparação com anos anteriores.
Tal justificação, de tão absurda, nem merece comentários sendo de lembrar que os critérios de avaliação do desemprego foram alterados de modo a apresentar números mais favoráveis, não tendo, na altura, o Governo demonstrado preocupações com eventuais problemas ou dificuldades na comparação.
No entanto, igualmente grave, é a falta de vontade política para assumir a realidade, optando os sucessivos governos por manter uma ilusão que talvez beneficie a imagem do País no exterior, mas que, na verdade, já não engana nem mesmo os mais incautos.
Tal como em muitas outras áreas, onde não existem estatísticas de fontes independentes, os números dos acidentes de viação não inspiram qualquer confiança, pecando por defeito e não traduzem em nada a realidade nacional, sendo manifestamente manipulados de modo a esconder a tragédia que se vive nas estradas portuguesas.
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