segunda-feira, outubro 02, 2006

Quadratura do Círculo Especial - Conferências do Lake


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O pouco prestigiado Parlamento português

Algumas intervenções no programa Quadratura do Círculo Especial - Conferências do Lake, transmitido na noite do último Sábado na SIC e que contou com a presença do ex-presidente da República, Jorge Sampaio, não podem deixar de merecer algumas considerações, nomeadamente no respeitante ao cada vez maior alheamento dos cidadãos relativamente a questões ou temas relacionados com a política e a governação.

As sondagens ou estudos de opinião que abordam o divórcio entre a política e os cidadãos têm como característica comum, e provavelmente inevitável, a unilateralidade, explorando apenas a opinião de uma das partes e cabendo à outra, do alto de uma cátedra, opiniar sobre hipotéticas razões que possam ter provocado o que é comum chamar o desprestígio da classe política.

Na verdade, destes inquéritos resulta apenas um conjunto de respostas não comprometedoras, que dão uma imagem do que a população em geral pensa dos orgãos de soberania ou da chamada classe política, mas ficam por responder o que estes últimos esperam dos cidadãos.

A falta de participação cívica tem, lamentavelmente, muito a ver com esta últma permissa e deve-se em grande parte á postura dos detentores de cargos públicos e à forma como respondem ou não a interpeleções da sociedade civil.

Exemplos básicos são as petições entregues na Assembleia da República, que correspondem a um enorme esforço por parte dos seus promotores, normalmente com poucos ou nenhuns apoios, e que raras vezes são discutidas ou, no mínimo, analizadas em tempo oportuno e de acordo com o regulamentado, podendo perder-se eternamente nos corredores do Parlamento.

Também a correspondência que é enviada aos orgão de soberania, com propostas, ideias, estudos ou qualquer outro contributo, e nestas excluo reclamações ou queixas que têm um tratamento diferente, quando existe resposta, não merecem mais do que umas breves linhas de agradecimento que, pelo seu conteúdo, mais parecem um "não nos telefone, nós contactamos".

Obviamente, muita outra correspondência, e neste caso dou particular destaque a mensagens enviadas por correio electrónico, nem sequer merecem uma resposta, facto que é facilmente verificado através de missivas enviadas por este meio aos vários grupos parlamentares, dos quais apenas dois responderam.

Logicamente, mesmo para o cidadão mais empenhado mas que por opção não está enquadrado num partido político, tal atitude rapidamente leva a uma indiferença ou mesmo a uma hostilidade que, efectivamente, não se pode deixar de compreender.

Assim, perante a experiencia passada, não é difícil concluir que actualmente o cidadão, ou os direitos de cidadania se esgotam no conjunto votante/contribuinte, sendo que, para além destas duas obrigações, tudo o mais surge como um incómodo que parece ser dificilmente tolerado.

Consequentemente, a postura do cidadão comum perante a actual classe política, que com ele não estabelece qualquer tipo de relação que não as mencionadas, é a de indiferença, eventualmente de rejeição, que pode ser facilmente manipulada através de um conjunto de ideias ou propostas mais ou menos demagógicas ou populistas.

Portanto, quelquer revisão de sistema que passe pela redução dos actuais titulares recebe uma aprovação generalizada, que em nada tem a ver como o modo de funcionamento, mas tão somente com o desejo de substituir os actuais protagonistas.

Sem nos alongarmos sobre a actual classe política, na sua maioria oriunda de juventudes partidárias e não recrutada entre os melhores estudantes universitários ou numa elite cultural, científica ou intelectual, tal como mencionou Pacheco Pereira numa edição anterior do mesmo programa, do que decorre a necessidade de uma espécie de blindagem como meio de a tornar impermeável à entrada de quem, pelo seu mérito, possa por em causa a qualidade dos actuais quadros dirigentes.

No entanto, longe de responsabilizar quem recorre a estes argumentos, visamos especificamente quem, pela sua indiferença e alheamento, ainda não compreendeu plenamente a dimensão do cargo para que foi eleito ou nomeado, refugiando-se em estudos que, pela sua parcialidade, dão conta de consequências e não de causas.

Confundir ou misturar causa e efeito, mais do que manipular a opinião pública, serve para transferir a responsabilidade de quem não é capaz de analizar, de forma crítica, o que está efectivamente mal na relação entre política e cidadania para todos aqueles cuja voz é diariamente ignorada.

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