quarta-feira, fevereiro 14, 2007

Acidente na linha do Tua


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Comboio na linha do Tua (foto Expresso)

Confundir causas com consequências parece ser uma estratégia típica de desculpabilização montada pelas entidades responsáveis por serviços ou equipamentos cujas falhas originam acidentes.

O descarrilamento de um comboio na linha do Tua de que resultou a presumível morte de três tripulantes é disso exemplo, se atentarmos às declarações de responsáveis da Refer, empresa responsável pelo estado de conservação e pela manutenção da mesma.

Segundo as declarações prestadas a queda de pedras teria, por um lado, descalçado a via retirando-lhe a sustentação e por outro atingido a composição na fente e na parte lateral, empurrando-a para o abismo.

Dito desta forma tal parece uma infeliz coincidência, um daqueles acidentes absurdos que, apesar de uma probabilidade mínima, podem acontecer e curiosamente tendem a repetir-se entre nós, dando uma aura de inevitabilidade à "Lei de Murphy".

Mas se em vez de aceitar pacificamente estas conclusões tentarmos elaborar um pouco, alguns factores fundamentais que contribuiram decisivamente para o sucedido podem e devem ser alterados, resultando numa abordagem completamente diferente da descrita pela Refer.

Por um lado, atribuir meramente ao acaso a queda de pedras capazes de provocar este acidente é redutor, pois em zonas onde a possibilidade exista devem ser tomadas medidas para o evitar, como a colocação de redes de protecção nas encostas de modo a evitar deslizamentos, ou a remoção de pedras de maior dimensão que possam provocar um descarrilamento.

Por outro lado estes acidentes acontecem quando um comboio está a passar, pelo que é óbvio que o deslocamento de terras resulta da vibração provocada pela composição quando esta se aproxima, bem como do próprio peso quando passa no local, razão pela qual existe uma relação directa entre a circulação e as supostas causas do acidente.

Como não está disponível e seria difícil de instalar um sistema automático que alerte para danos na via, estes são detectados da pior forma, ou seja, quando ocorre um acidente, dado que uma mera inspecção visual dificilmente pode detectar estas falhas ou perigos potenciais.

Conclui-se que, para além de uma eventual falta de manutenção e de cautelas, a verdadeira causa não é a suposta queda de pedras, fruto de um azar que parece ser tradicional entre nós, mas sim o que provocou o seu desprendimento, ou seja, o movimento da própria composição que circulava numa zona cujo perigo é reconhecido por todos.

Desta forma, sendo a causa diferente, a justificação da Refer acaba por não passar de uma tentativa de refutar a responsabilidade objectiva que tem, sendo inaceitável que se possam aceitar como um mero capricho da Natureza as causas apontadas pela empresa para a ocorrência deste acidente.

Esperamos que, como de costume, o inquérito não seja esquecido e que seja feito com todo o rigor, de modo a que sejam apurados os verdadeiros responsáveis e se evite que situações semelhantes se repitam impunemente no futuro.

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