domingo, abril 22, 2007

Arquivado o inquérito do MP ao acidente de Famalicão da Serra


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Floresta queimada em Famalicão da Serra

O Ministério Público (MP) da Guarda decidiu arquivar o inquérito relativo ao incêndio de Famalicão da Serra, ocorrido em Julho de 2006, que provocou a morte de cinco bombeiros sapadores chilenos e um bombeiro português.

Segundo o despacho de arquivamento, "o incêndio teve origem meramente acidental durante a realização de trabalhos de limpeza", tendo o procurador aceite a tese do proprietário do terreno que considerou ser o Verão é a época do ano "mais apropriada" para limpar terrenos e que "não é previsível" que faíscas de motorroçador possam vir a causar um incêndio.

Para o presidente da Junta de Freguesia de Famalicão da Serra, onde ocorreu o incêndio e de onde o bombeiro Sérgio Rocha aí falecido era natural, o despacho de arquivamento é uma "surpresa", pois esperava "que houvesse mais alguns desenvolvimentos".

Lamentavelmente, não ficamos surpreendidos com uma decisão que segue na mesma linha de tantos outros inquéritos, onde da não intencionalidade, que não questionamos, decorre imediatamente a teoria do acidente, que assenta num misto de imprevisibilidade e de desresponsabilização.

Aceita-se, entre nós, que um acidente seja considerado, na sua essência, como algo que não pode ser evitado, como uma espécie de destino cruel contra o qual nada há a fazer, pois a despeito de cuidados e precauções, inevitavelmente sucederá.

É integrado nesta visão redutora que surge o arquivamento deste caso, que minimiza a possibilidade de um equipamento mecânico provocar um incêndio, como se comprova pelos factos, considerando assim que, pela sua improbabilidade, não haverá qualquer responsabilidade de quem praticou a acção.

Esta teoria permite, na prática, que qualquer situação de risco improvável, mesmo que conhecido, desde que alicerçado em probabilidades que asseguram que raramente terá consequências, possa ser encarado com leveza e sem os necessários cuidados que a própria lei impõe.

Não se justifica ilustrar com exemplos práticos algo que faz parte da vivência nacional, no pressuposto de que os azares acontecem aos outros ou de que, sendo só desta vez que se arrisca, certamente tudo correrá pelo melhor, mas não podemos deixar de recordar que existe uma cultura que despreza a segurança e aceita o risco como um mero desafio inerente a qualquer actividade.

Para além do arquivamento do processo crime, também os resultados do inquérito realizado por uma comissão de especialistas permanecem por divulgar, sendo conhecidas apenas conclusões perliminares, pelo que, lembramos as palavras do autarca de Famalicão da Serra quando, tal como nós, lembrou que "a culpa acaba por morrer solteira, embora haja que lamentar mortes".

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