Viatura Médica de Mergência e Reanimação
Num texto anterior, tecemos algumas considerações quanto aos efeitos de um conjunto de medidas de carácter economicista que, podendo equilibrar marginalmente as contas do Estado no curto prazo, têm efeitos desastrosos no desenvolvimento de várias zonas do País e violam princípios básicos de solidariedade nacional.
No mês de Janeiro, ocorreu um acidente de viação no Alentejo, tendo demorado seis horas até que a vítima tenha dado entrada num serviço capaz de lhe prestar os cuidados médicos de que carecia, sendo que a demora veio a revelar-se fatal.
Devemos, ainda realçar que, por ter falecido uma semana após o acidente, esta vítima não será contabilizada entre os que morrem em consequência de acidentes de viação, facto que desacredita completamente as estatísticas publicadas em Portugal.
A cronologia deste acidente, que fazemos de modo análogo ao da "Luz do Sameiro", com descrição da intervenção dos meios de socorro, demonstra a ineficácia que deriva da existência de uma única Viatura Médica de Emergência e Reanimação (VMER) disponível no distrito de Beja.
Ressalvamos que pode haver pequenas diferenças, em termos de minutos, na cronologia apresentada, sem que de tal resulte uma alteração substantiva dos factos e do resultado final.
07:28 - António José Guerreiro Oliveira é atropelado por uma viatura, quando seguia de bicicleta na EN393, a poucos quilómetros de Odemira, sofrendo múltiplos traumatismos, fractura exposta do braço e lesões cranio-encefálicas.
07:40 - Após contacto com o 112, a triagem foi efectuada pelos serviços do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), que enviaram para o local uma ambulância dos Bombeiros Voluntários de Odemira.
08:20 - A vítima dá entrada no Centro de Saúde de Odemira, onde os médicos do SAP tentam durante uma hora estabilizá-lo, sem sucesso, até decidirem transferí-lo para o Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
09:30 - Já no interior da ambulância, o estado do ferido agravou-se e os médicos de Odemira decidem chamar a única VMER, com um médico especialista em emergência, disponível para todo o distrito, estacionada no Hospital de Beja, a 100 quilómetros de distância.
10:30 - A VMER chega a Odemira e procede à avaliação do ferido.
11:30 - O médico da VMER pede ao INEM que envie o helicóptero em serviço em Lisboa.
12:30 - O helicóptero chega a Odemira.
13h10 - O helicóptero levanta voo a Lisboa, a baixa altitude e à velocidade mínima, dado o estado do ferido.
Dias após o acidente, António Oliveira morre em consequência dos ferimentos.
Torna-se impossível combater a desertificação do Interior do País, quer combatendo as migrações, quer promovendo a instalação de novos habitantes sem garantir condições de acesso à saúde, nomeadamente em caso de emergência médica, mesmo que seja dada algum tipo de compensação financeira a quem aí pretenda fixar-se, facto de que resulta um manifesto desiquilibrio demográfico.
A desactivação de meios, o encerramento de unidades de saúde, o aumento da espera por meios de socorro eficazes, revelam-se fatais em caso de emergências e facilmente afastam quem pretenda começar uma nova vida numa localidade afastada dos grandes centros urbanos onde se concentram cada vez mais os recursos indispensáveis a um socorro eficaz.
O trágico e lamentável desfecho deste acidente não pode ser imputado a uma combinação de factores aleatórios, que em conjunto levaram à morte de um sinistrado, mas sim a uma série de decisões que determinaram um resultado possível de prever e de antecipar mediante um estudo cuidadoso e um planeamento correcto.
Uma das funções essenciais e nas quais o Estado é insubstituivel, é garantir a segurança dos seus cidadãos, protegendo-os e assegurando um socorro eficaz, sendo inaceitável que existam a este nível falhas derivadas de problemas estruturais resultantes de decisões políticas onde os critérios económicos determinam antecipadamente o destino de vítimas de acidentes.
2 comentários:
www.bombeirosdefozcoa.blogspot.com
Muito bem.
Não é só em Beja [Odemira] que há problemas de desertificação, mas no distrito de Bragança, Portalegre, Évora e Faro. Há problemas na alocação de recursos humanos e materiais devido à excessiva centralização.
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